XXIV Congresso Nacional Do CONPEDI - UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara

TEORIAS DA JUSTIÇA, DA DECISÃO E DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

O presente livro aborda temas que, muito embora raramente tratados em conjunto, são de grande relevância na medida em que há possibilidade de uma análise que mostre certa confluência entre os mesmos. As temáticas que permeiam as distintas teorias da justiça, da decisão e da argumentação são muitas e, certamente, é possível tratá-las, até certo ponto, separadamente. No entanto, igualmente válido é observá-las em sua unidade. Temos em conta nesses termos, que um tratamento do Direito que deixe de problematizar a própria prática jurídica (bem como sua fundamentação) é, para dizer o mínimo, insuficiente. Neste sentido, pode-se considerar bastante proveitosa a posição segundo a qual, há uma unidade inseparável entre os textos que compõem o presente livro.

Justamente ao passar por uma grande variedade de temas e de autores, tem-se algo central à teoria do Direito contemporânea: a explicitação do fato segundo o qual qualquer abordagem “jurídica” envolve, ao mesmo tempo, a apreensão da especificidade do Direito e o modo pelo qual esta última relaciona-se com distintas esferas da sociabilidade, como a moral, a ética, a política, dentre muitas outras, as quais, de modos diversos, são tematizadas aqui.

Para que se ressalte algo, é bom trazer à tona um aspecto que não pode ser deixado de lado: é de conhecimento de todos aqueles que leram com o mínimo de atenção a obra de Hans Kelsen que sua Teoria pura do Direito não é uma “teoria do Direito puro” (embora seja necessário destacar que, por vezes, falte muita “atenção” na pesquisa jurídica realizada no Brasil). Por conseguinte, há de se perceber que mesmo um autor normativista, como Kelsen, que não tematiza a todo o momento acerca do processo decisório e da fundamentação das decisões judiciais, não fecha a porta de modo resoluto à teorização acerca da maneira pela qual pode haver – na prática jurídica, e não em uma “teoria pura” - uma relação necessária, por exemplo, entre o Direito e alguma posição moral, política, filosófica, etc, etc.

Ainda sobre o ponto, pode-se destacar que justamente o capítulo final da obra magna do autor abre um grande espaço para estas questões que, ao fim, aparecem quando se tem em conta a questão da interpretação, bem como de sua relação, a ser vista de um modo ou doutro, com a aplicação.

Certo é que interpretação e aplicação, a rigor, não podem ser retiradas de campo quando se aborda o Direito: tanto as codificações, quanto quaisquer espécies normativas, não “dizem” nada por si mesmas, não podendo haver uma fetichização do texto, como apontaram os mais diversos autores (muitos deles tratados por aqueles que contribuem para o presente volume).

Neste sentido, não pode deixar de ser interessante tratar dos temas aqui albergados em conjunto (mesmo que eles possam, como mencionamos, ser vistos separadamente também), sendo de bastante relevo para aqueles interessados na teoria do Direito – e nas áreas a ela relacionadas – a apreensão da especificidade, bem como da indissociabilidade, entre os diversos autores tratados neste volume.

É interessante que mesmo que se parta de Kelsen que pode ser visto como o maior autor do positivismo de cunho normativista, percebe-se que a questão da fundamentação, bem como da argumentação – as quais remetem à problemática da justiça – não podem ser tiradas de cena ao se tratar do Direito.

A questão, claro, ganha bastante destaque posteriormente ao debate entre Herbert Hart e Ronald Dworkin, tendo-se, com este debate, uma problematização explícita tanto das bases filosóficas da teoria do Direito quanto do modo pelo qual, ao final, haveria uma relação entre Direito e moral, seja ao modo de um conceito semântico de Direito em que se tematiza a relação entre a perspectiva interna e externa, como em Hart, seja com uma concepção decididamente hermenêutica como a de Dworkin.

Outra questão a se destacar é que, embora o “debate metodológico” tenha se passado permeando principalmente a teoria do Direito de talhe anglo-americano, ele influenciou todos aqueles que, posteriormente, trataram do Direito com seriedade. A teoria do Direito alemã, com Alexy principalmente, dentre outras coisas, procurou debater com a concepção de Dworkin acerca dos princípios, trazendo à tona, novamente, questões que remeteram à filosofia e à teoria do discurso.

Neste sentido, é bom que se tenha claro: aquilo a ser conhecido ao se ter em conta as teorias sobre o Direito ganha mais amplitude ainda, sendo necessário ao jurista, por exemplo, averiguar a qual teoria acerca da linguagem adere: Austin? Wittgeinsten? Habermas? Appel? Algum outro? Também neste sentido, o modo pelo qual aparecem os diversos textos deste volume (em conjunto) não deixa de expressar a situação particular na qual os estudos sobre o Direito se encontram explicitando-se justamente que uma concepção tecnicista acerca do Direito não é mais possível. Mais ainda: uma concepção tecnicista sobre o Direito, justamente ao não abordar aquilo no que sua argumentação se embasa aceita, inadvertidamente, posições não explicitamente tematizadas. E justamente a tematização disto parece ser essencial.

Ainda para que se remeta ao modo pelo qual amplia-se o estudo do Direito ao se ter em conta o panorama atual um autor como Roberto Gargarella não deixou de mostrar como uma análise entre a posição de Rawls e de Dworkin poderia ser central e, neste sentido também deve-se destacar que, ao se tratar da teoria do Direito, também se tem uma conexão estreita com a teoria da justiça (embora não só com ela, claro). Ou seja, justamente a conformação do debate em torno do Direito atual propicia uma aproximação entre teorias da justiça, da decisão e da argumentação e, nesses termos, o presente livro talvez possa contribuir, mesmo que de modo modesto.

Poderíamos enumerar vários outros modos pelos quais a questão se delineia no presente livro, apontando, por exemplo, a importância da teoria de Honneth na contemporaneidade, ou as questões ligadas às minorias, ao racismo, ao sexismo e transfobia; poderíamos ainda destacar a importância destas questões passando pelo modo, por vezes apressado, pelo qual elas aparecem nos tribunais superiores no Brasil. No entanto, havendo destacado o cenário geral, passarmos a citar os textos aqui trazidos a lume.

O primeiro texto diz respeito a temática entre a Hermenêutica filosófica e a teoria da Argumentação jurídica. Esse tema vem sendo objeto de debate na doutrina brasileira nos últimos anos, entre aqueles que são adeptos da hermenêutica filosófica e entendem que as teorias da argumentação desprezam a hermenêutica, e aqueles adeptos da teoria da argumentação, que entendem que os hermeneutas dão muito peso a hermenêutica e desprezam as técnicas de argumentação que produziriam racionalidade e segurança no processo de decisão do Direito. O texto se intitula: OS JURISTAS SABEM DO QUE ESTÃO FALANDO OU FALAM SOBRE O QUE SABEM? UM DIÁLOGO ENTRE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA E HERMENÊUTICA FILOSÓFICA; O segundo texto aborda a situação dos refugiados numa interface com a obra de Hans Kelsen e é intitulado A ILUSAO DA JUSTICA POR KELSEN; O terceiro busca trabalhar a questão da fundamentação das decisões e é intitulado ANALISE DA NECESSIDADE DE FUNDAMENTACAO DAS DECISOES JUDICIAIS SOB A PERSPECTIVA DO DISCURSO JURIDICO; Já o quarto texto apresenta uma crítica ao art.489 do novo CPC e é intitulado de TEORIA DA ARGUMENTACAO JURIDICA E FUNDAMENTACAO JUDICIAL NO NOVO CODIGO DE PROCESSO CIVIL: INSUFICIENCIAS DO METODO LOGICO-DEDUTIVO E A PROPOSTA DE UMA RACIONALIDADE PRAXE; O quinto texto traz um estudo de Aristóteles, Kant e Sandel e é intitulado JUSTICA EM ARISTOTELES, KANT E SANDEL: UM ESTUDO COMPARADO; O sexto texto trabalha com Rawls e Dworkin tendo como base as teorias da justiça desses autores do liberalismo norte-americano e é intitulado A EQUIDADE EM UMA DEMOCRACIA: ANALISE COMPARATIVA ENTRE RAWLS E DWORKIN; O sétimo versa também sobre Dworkin, mas pela ótica da jurisdição constitucional e é intitulado CONTRIBUICOES DE RONALD DWORKIN A JURISDICAO CONSTITUCIONAL; O oitavo texto discute novamente a teoria da justiça pela ótica do embate entre o liberalismo e o comunitarismo e é intitulado de IGUALDADE E DIFERENCA: O CONCEITO DE JUSTICA NO ESTADO DEMOCRATICO DE DIREITO A PARTIR E ALEM DO COMUNITARISMO E DO LIBERALISMO; O Nono texto volta a temática de Ronald Dworkin e a sua teoria da justiça a partir da ótica do planejamento e tem como título JUSTICA DISTRIBUTIVA DE RONALD DWORKIN E A OBRIGACAO CONSTITUCIONAL DE PLANEJAR; O decimo texto trabalha com as teorias da justiça e é intitulado de LIBERALISMO, LIBERAL-IGUALITARISMO OU COMUNITARISMO?; O decimo primeiro ensaio trabalha a temática da relação entre a liberdade e a justiça, tendo como pano de fundo a perspectiva marxista, e é intitulado de LIBERDADE VERSUS JUSTICA SUBSTANTIVA: TEORIAS ACERCA DAS (DES)IGUALDADES E (NAO)LIBERDADES NA VISAO DE ROUSSEAU E MARX. TERA SIDO MARX INFLUENCIADO PELAS IDEIAS DE ROUSSEAU E ATE QUE PONTO?; O decimo segundo texto aborda a questão das normas de direito internacional na interface com a Corte Internacional de Justiça e é intitulado de NORMAS PROCESSUAIS E NORMAS SUBSTANTIVAS: A PRIMAZIA DAS NORMAS DE JUS COGENS E O ENTENDIMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTICA; O decimo terceiro texto trabalha a questão da fundamentação das decisões e é intitulado de O PRINCIPIO DA FUNDAMENTACAO DAS DECISOES JUDICIAIS FRENTE A IDEOLOGIA DA TEORIA POLITICA; O decimo quarto ensaio versa sobre a perspectiva pragmatista na teoria da decisão e é intitulado de MODELO PRAGMATISTA DE DECISAO NO DIREITO: DO MENTALISMO INSTRUMENTAL A INTERSUBJETIVIDADE COMUNICATIVA; O decimo quinto ensaio trabalhou a obra do professor Humberto Ávila pela ótica da interpretação do direito e é intitulado de OS POSTULADOS NORMATIVOS NA DOUTRINA DE HUMBERTO AVILA E SUA APLICACAO NA INTERPRETACAO CONSTITUCIONAL EM CASOS DIFICEIS; O decimo sexto texto trabalha a obra do professor de Kiel Robert Alexy e é intitulado de RACIONALIDADE DADA DECISAO JUDICIAL EM ROBERT ALEXY; O decimo sétimo ensaio trabalha a questão do pluralismo jurídico na teoria da decisão e é intitulado de AS FONTES PLURAIS DO DIREITO, A ATUACAO DAS PARTES NO PROCESSO E A NECESSIDADE DE LEGITIMACAO DA DECISAO JURISDICIONAL; O Decimo oitavo texto trabalha a obra do professor Axel Honneth e a crítica do mesmo as tradicionais teorias da justiça e é intitulado de AXEL HONNETH E A RECONSTRUCAO DA JUSTICA: UMA TENTATIVA DE SUPERACAO DO “PARADIGMA DA DISTRIBUICAO”; O decimo nono texto trabalha a obra de Paul Ricoeur e é intitulado de A TEORIA DA JUSTICA NA CONCEPCAO DE PAUL RICOEUR EM FACE DA INTERGERACIONALIDADE DO IDOSO BRASILEIRO; O vigésimo texto desse livro aborda a obra de David Trubek e é intitulado de A TEORIA SOCIAL DO DIREITO NA CONCEPCAO DE DAVID M. TRUBEK; Logo em seguida temos o importante tema da justiça de transição abordado no texto DAS DIVERSAS FORMAS DE JUSTICA E DA JUSTICA DE TRANSICAO; O vigésimo segundo texto trabalha os precedentes da Corte Europeia de Direitos Humanos e é intitulado de OS PRECEDENTES DA CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS COMO INSTRUMENTO DE REFINAMENTO DAS NORMAS DE DIREITOS HUMANOS: DECISAO JUDICIAL E NORMA DE DIREITO FUNDAMENTAL ADSCRITA/DERIVADA; O próximo ensaio trabalhou a obra de Amartya Sen na interface com o processo civil e é intitulado A IDEIADE JUSTICA EM AMARTYA SEN E A RAZOAVEL DURACAO DO PROCESSO; Novamente temos o professor Amartya Sen como marco teórico, agora no tocante a questão do gênero no texto A IDEIA DE JUSTICA DE AMARTYA SEN: UM ENFOQUE SOBRE A IGUALDADE DE GENERO; O vigésimo quinto texto trabalha os conflitos intergeracionais e é intitulado de MORTOS, VIVOS E NAO NASCIDOS: CONFLITOS INTERGERACIONAIS LIGADOS AO PROGRESSO E AO RETROCESSO NAS DEMANDAS CONSTITUCIONAIS; O vigésimo sexto texto apresentado envolve o intenso e atual debate europeu sobre o multiculturalismo e a xenofobia e é intitulado de MULTICULTURALISMO, TOLERANCIA E XENOFOBIA: UMA CRITICA DO RECENTE CONTEXTO EUROPEU; O vigésimo sétimo texto aborda a questão da transexualidade e é intitulado de JUSTICA?! O NOME, O SEXO E A LIBERDADE TRANS; O vigésimo oitavo ensaio volta a questão da transexualidade a partir da ótica das teorias do reconhecimento e é intitulado TRANSEXUALIDADE E TEORIA DO RECONHECIMENTO: DE UM MODELO PATOLOGIZANTE A UMA NOVA MANEIRA DE PENSAR ATRAVES DA CONTRIBUICAO TEORICA DE NANCY FRASER.

Os organizadores convidam a todos a lerem os textos, que como já externalizado, guardam uma interface entre as teorias: da justiça, da argumentação e da decisão.

ISBN: 978-85-5505-135-7


Trabalhos publicados neste livro: